Quiçá, um afago d’a Banda Mais Bonita da Cidade

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Passaram-se alguns anos desde a primeira vez que a admiração da cantora, compositora e multi-instrumentista, Labaq, ultrapassara o sentimento comum entre fã e ídolo para se converter em uma parceria com A Banda Mais Bonita da Cidade. Em 2017, o grupo realizou um show em Franca-SP, cidade natal da artista, que interpretou “Oração” em companhia de Uyara Torrente.

Desse encontro, uma sensação rara. Labaq pôde compreender intimamente suas conexões com A Banda, uma vez que afinidades ideológicas, musicais e, quiçá, espirituais, despertaram interesses. A expectativa para uma parceria criativa amadureceu junto a uma relação próxima. Deste elo, surge o single “Quiçá”, produção complexa e imersiva, lançada pel’A Banda Mais Bonita da Cidade na última sexta-feira (01).

Em meio ao caos do confinamento, embora a obra possa ser facilmente interpretada como um retrato poético do momento atual, talvez seja melhor encarada como uma prece. Aos céticos, talvez seja até difícil acreditar que fora composta já há alguns anos, por Labaq, mas mesmo para estes, é improvável que a canção não soe como um afago para os tempos de agora.

Foi assim que eu me senti cantando Quiçá pela primeira vez, abraçada — Uyara Torrente

Não se trata apenas de uma letra derivada do otimismo, mas de uma experiência sensorial que, para Uyara Torrente – vocalista da banda, abraça o ouvinte de alguma maneira.

“Acho que há coisas muito simples na letra e coisas muito poderosas também. E acho que é um momento de revisitar esse simples, até contra a nossa vontade, porque ninguém queria estar em casa. Mas a coisa da pandemia e do isolamento tem nos estimulado a novas percepções de questões banalizados na correria do dia a dia.”

É uma música que inspira e se inspira em mudanças. Baseia-se numa harmonia fluida como a mensagem que carrega. Em meio a tantas adaptações compulsórias o single marca, também, um novo e definitivo momento da banda, que assume sua formação com quatro integrantes. Modificando, ou porque não, subvertendo, sua sonoridade. Como explica Uyara:

“O processo na verdade já começa diferente, para além da pandemia. Essa é a primeira produção que a gente faz sem o Marano e isso muda muita coisa. Sem um baixista a sonoridade se altera. O Vini, que sempre foi o maestro da Banda, cria há 10 anos sob bases muito parecidas, com baixo, bateria, teclado, voz e guitarra.

Quando se tira o baixo, essa junção precisa passar por algumas modificações para não ficar manca. Como esse foi o primeiro trabalho nesses moldes, o Vini teve que quebrar a cabeça pra pensar em uma sonoridade que não soasse vazia. A partir disso entraram elementos eletrônicos, por exemplo, algo que não fazia parte da nossa estética em outras fases.”

Foto Izabela Milita

A saída de Marano, ao fim de 2019, “catalizou algo que eu estava querendo há muito tempo”, explica o maestro. Vinicius Nisi, multi-instrumentista e produtor d’A Banda desde sua fundação, acredita que a “dificuldade causada pela saída de alguém tão importante emerge como uma oportunidade para se criar algo diferente”. Para Nisi, o momento de reinvenção flui entre suas atribuições profissionais e seus hábitos cotidianos. Consciente de seus privilégios, ressalta não só uma necessidade de reinvenção artística que dialogue e cative uma sociedade carente de cultura, mas de hábitos positivos individualmente:

“Fazer arte é estudar e repensar. Tentar fazer diferente daquilo que já fez. Não estou dizendo que fará grande diferença no mundo, mas sim para você. É quebrar barreiras internas, e estimular pensamentos: ‘e se fizer assim dessa vez?’. Arriscar, perder tempo (investi-lo, na verdade), voltar atrás, redescobrir e tentar de novo. Isso tem muito a ver com o isolamento, né? Estamos precisando ressignificar, aprender novas formas de agir e de nos enxergar, né? Isso enquanto indivíduos e enquanto humanidade.”

O processo que permeou os acontecimentos globais foi afrontado, mas jamais ameaçado pela restrições da pandemia. Vinicius Nisi, que já era atento às obras de Labaq sentia-se “há tempos reflexivo” sobre questões urgentes e sobre posicionamentos a serem tomados como artista, enquanto observava na compositora paulista uma capacidade de orientar suas ponderações. No início do ano, botou em prática seu antigo desejo.

“Começamos em janeiro, sem pressa. Com esse pesadelo que estamos passando enquanto humanidade achamos que era um momento bom de tentar passar essa esperança, esse carinho e calor que precisamos sentir por dentro pra superar tudo o que temos que viver por fora.”

A sensação de referência é recíproca.

Eles falavam do que eu tava a fim de falar, porque eles mostravam como eu tava a fim de mostrar — Labaq

Há mais de um ano A Banda, representada por Vini, manifestara a intenção de gravar “Quiçá”. Depois de ter passado uma semana em Curitiba, no início de 2020, Labaq conta que foi possível para ambos perceberem que, além dessa reciprocidade, outras referências também convergiam, conectando-os cada vez mais. Não apenas no âmbito profissional, mas ideológica, artística e, sobretudo, esteticamente.

“São praticamente as mesmas coisa que mexem com a minha cabeça e que mexem com a cabeça do Vini. Em termos de produção, isso deixa a gente dialogando demais, querendo falar as coisas leves, as coisas que a gente precisa, mas ao mesmo tempo trazendo uma força estética, indo pra um lugar não tão óbvio. Eu acho que a gente tá falando uma mesma coisa pra um mesmo sentido sabe?”

O grupo e a cantora alinharam as ideias virtualmente em meados de fevereiro quando Labaq, de volta à Portugal, já vivia o isolamento social. Após receber as primeiras versões, produzidas por Vinicius Nisi, ainda desacreditada, gravou sua participação na música, que já tão relevante em sua carreira, ganhou ainda mais significados.

“Resgatá-la no momento de agora é forte, porque tudo ali é novamente ressignificado. Tanto que as mudanças que a gente fez na letra foram porque, obviamente, muitas refletem de outros jeitos hoje em dia. Faz muito sentido a gente rever esse tipo de coisa agora também né?

Hoje cada vez que eu ouço, falo: ‘porra cara, que honra que coisa incrível que eles fizeram, que pensamento maduro, que honra conhecer essas pessoas, que incrível poder estar perto de artistas tão pra frente’. É uma maturidade que eu admiro demais, de quem rodou vários caminhos e absorveu muitas coisas pra chegar ali sabe? É desse tipo de gente que eu topo ser fã . Gente que pensa pra frente, gente que não tem medo de deixar o antigo pra trás, ou que não tem medo de vestir uma roupa nova, totalmente nova de repente, porque quer ou por necessidade, enfim por mil questões. Eu acho maravilhoso.”

Responsável pela mixagem da música, o curitibano Guigo Berger, detalhou o processo atípico em uma conversa com a Pangea. Para se aprofundar um pouco mais nos detalhes técnicos confira abaixo

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Ouça Quiçá